meistudies, 4º Congresso Internacional Media Ecology and Image Studies - Reflexões sobre o ecossistema midiático pós pandemia

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Arte, Mídia e Solitude: A Construção de um Olhar Poético sobre o Cotidiano durante a Pandemia de COVID-19.
Anna Carl Lucchese

Última alteração: 2021-10-13

Resumo Expandido (Entre 450 e 700 palavras)


Durante a pandemia de COVID-19, comecei a elaborar um curso de práticas criativas.  Meu objetivo era construir um laboratório de coleta de dados durante o isolamento forçado pelo vírus. Desenvolvi uma série de exercícios para serem feitos no espaço doméstico, tendo como base conceitos e estudos relacionados ao tema da arte, mídia e solitude, em um diálogo entre duas linhas de pesquisa: Processos e Procedimentos Artísticos e Produção de Sentido na Comunicação Midiática.

Montei dois grupos de alunos para aplicar o curso. A primeira tarefa consistia em cada um descrever a maneira como se expressava em seu perfil pessoal no Instagram. Pedi para que me apontassem se havia uma quantidade maior de selfies ou de registros contemplativos, se o conteúdo era focado na vida profissional ou pessoal, se as postagens eram apresentadas de forma mais agressiva, afetuosa, ou bem-humorada, e assim por diante. Inspirada no Cultural Analytics Lab, de Lev Manovich (2017), escolhi essa mídia por ser uma ferramenta popular, com a qual o indivíduo vem elaborando um olhar poético sobre o cotidiano contemporâneo.

Em seguida, pedi para que meus alunos fizessem um exercício de contemplação. Eles deveriam escolher um local e descrever por escrito ou em áudio o que viam, ouviam e sentiam no contato com aquele ambiente. Meu objetivo era estimular um olhar poético sobre o banal. Essa prática não é uma estratégia nova, mas é uma importante ferramenta criativa que vem caindo em desuso pela velocidade com a qual a rotina nos atravessa. Minha inspiração dialoga com a deriva dos Situacionistas (Bourriaud, 2009), com as fotografias de Henri Cartier-Bresson (2014) (Assouline, 2012), com o poema Na Sala de Espera, de Elizabeth Bishop (2012) e com o ensaio A Room of One’s Own, de Virginia Woolf (1929). Cada um desses trabalhos materializa descobertas expressivas extraídas do estar só em contato com o mundo.

Hoje, a palavra solidão é o termo mais comumente usado para nomear a experiência de estar só, porém ela também agrega como característica uma conotação negativa, junto a um sentimento de desconexão e melancolia. Desde o século XIX, essa relação vem sendo alimentada, em conjunto com o conceito de individualismo e em decorrência das transformações provocadas pela industrialização e pelo êxodo urbano, como descreve o livro A biography of loneliness. The history of an emotion. (Alberti, 2019) Antes desse processo de mudança social, uma palavra que era usada com mais frequência para descrever a experiência de se estar sem a companhia de outra pessoa era solitude, um termo mais neutro que não carrega o peso da experiência contemporânea de um individualismo predador.

Assim, ao resgatar a solitude na contemporaneidade, tenho como objetivo forjar um movimento de mutação da experiência estética vivida em contato com o mundo. Por isso, ao elaborar o curso de expressividade, quis colocar a prática da contemplação em solitude na sequência do exercício de descrição do perfil pessoal do Instagram. Com essa estratégia, crio um contraponto entre a construção de sentido que se faz a partir de uma produção voltada para um público virtual e a experiência estética elaborada longe do olhar do outro.

Os dados colhidos no decorrer do desenvolvimento do curso revelam também algumas possibilidades de experiências estéticas possíveis durante o isolamento forçado pela pandemia. A criação de práticas e estratégias arte-midiáticas pode apontar caminhos para a construção de uma maior diversidade de conhecimentos sensíveis e de formas de existência que nos auxiliem a extrair sentido do momento atual.



Palavras-chave


Processo Criativo; Experiência Estética; Pandemia de COVID-19; Arte, Mídia e Solitude.

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