Última alteração: 2021-10-19
Resumo Expandido (Entre 450 e 700 palavras)
Em acordo com a estética do contemporâneo emergem narrativas marcadas pela subjetividade do dizer, rompendo com o viés da objetividade e da racionalidade técnica que vigorou por mais de 300 anos. Este tempo, também denominado de Pós-Modernidade - embora não haja um consenso teórico em torno do termo - oportuniza a identificação de reconfigurações narrativas que merecem atenção na disputa de atenção dos leitores. Assim, observamos que estratégias narrativas derivadas da evidência daquele que narra têm ofertado sentido de (mais) crediblidade no contemporâneo.
Por essa perspectiva, a pesquisa tomará como amostragem duas narrativas em que tais estratégias aparecem com mais evidência, quais sejam, o colunismo contemporâneo dentro do gênero opinativo do jornalismo e nas biografias. nas quais desponta o conceito de atorização. De forma breve, a atorização é entendida pela inserção do jornalista também como produtor de significação (FAUSTO NETO, 2015) e está inserida no campo dos estudos da midiatização, segundo o qual destacamos a característica da autorreferência, ou seja, a produção de narrativas de si mesmo devido a irritações no sistema (SOSTER, 2015).
Aludimos ainda à teorização de Dunker (2018), segundo o qual há, no contemporâneo, a assunção da ideia de que cada um tem sua verdade. Trata-se da Pós-verdade que, no caso do jornalismo, incide especialmente como resultado do fim da exclusividade dos jornalistas em periciar a informação e publicá-la. Ou, dito de outra forma, fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e a crenças pessoais. É nessa esteira de pensamento que oferecemos nossa pesquisa, buscando destacar estratégias pelas quais as narrativas jornalísticas em que a subjetividade emerge, se diferenciam e se legitimam como mais qualificadas diante da oferta abundante de informações na rede.
No que diz respeito ao colunismo, inserido dentro do gênero opinativo das narrativas jornalísticas, um olhar exploratório indica haver uma ressignificação da categoria em busca de legitimação, uma vez que perdeu a exclusividade da emissão da opinião (e das subjetividades). Inclusive, determinadas estratégias rompem com a anatomia e características definidoras do gênero, segundo conhecemos pela classificação oriunda da Modernidade (MARQUES DE MELO, 2016). Do mesmo modo, as narrativas biográficas contemporâneas também revisitam os cânones conceituais do gênero, uma vez que, no contemporâneo, elas retratam a vida de um personagem ainda vivo, como já ocorrido na escrita biográfica do século XVIII, realizada com maestria por James Boswell. Dosse (2009) chama de biografia à moda anglo-saxônica, (desenvolvendo o enredo da pessoa viva), nos moldes das já conhecidas biografias de personagens vivos que hoje - se legitimam frente a um cenário que valoriza cada vez mais os relatos em primeira pessoa –, como se fossem algo concreto na busca por evitar o simulacro total[1].
Pretendemos, dessa forma, a partir da análise de excertos de uma coluna da jornalista Fabiana Moraes, no portal The Intercept Brasil, e da biografia Prólogo, ato, epílogo da atriz Fernanda Montenegro, apontar estratégias narrativas de distinção destas supostamente mais evidenciadas na figura do “eu” que narra e das subjetividades decorrentes. Deste modo, acreditamos que pensar a inserção daquele que narra também como produtor de significação, para além do fato narrado, é uma tendência possível frente à crise de credibilidade da informação no contemporâneo.
Bibliografia
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[1] Teoria de Jean Baudrillard (1999) – tela total: mito-ironias da era do virtual e da imagem.